Evangelho comentado pelo Pe. Carlo Battistoni
Postado por Jorge Kontovski
V Domingo da Páscoa
Jo 14,1-12
« Não se perturbe o vosso coração! Crede em Deus, e crede em mim. Há muitos lugares na casa de meu Pai. Se não fosse assim, eu vos teria dito, porque vou preparar um lugar para vós. E depois que eu me for e vos tiver preparado o lugar, virei outra vez e vos levarei comigo. Assim, onde eu estou, vós estareis também. Sabeis o caminho do lugar aonde vou”. Tomé lhe disse: “Senhor, não sabemos para onde vais. Como poderíamos, então, conhecer o caminho?”. Jesus respondeu: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim; se conhecêsseis a mim, conheceríeis também a meu Pai. Desde já o conheceis e o tendes visto”. Filipe disse: “Senhor, mostra-nos o Pai e isto nos basta!”. Jesus respondeu: “Filipe, há tanto tempo que convivo convosco e ainda não me conheces? Quem me vê, vê também o Pai. Como podes dizer: ‘Mostra-nos o Pai’? Não crês que eu estou no Pai e que o Pai está em mim? As palavras que vos digo não vêm de mim. Quem realiza estas obras é o Pai, que permanece em mim. Crede-me: eu estou no Pai e o Pai em mim. Crede ao menos em razão das obras. Em verdade vos digo: quem crê em mim fará as obras que eu faço. E fará até maiores, porque vou ao Pai. »
PALAVRA DA SALVAÇÃO - Glória a Vós, Senhor!
O Evangelho se abre com admiráveis palavras que aplaca o coração que se agita diante do turbilhão das inseguranças que, muitas vezes, induzem as pessoas a ter gestos e atitudes insanas. «Não se perturbe o vosso coração!» diz Jesus aos discípulos que estão prestes a entrar na maior crise de suas vidas; «Não se perturbe o vosso coração!» nos diz ainda hoje Jesus, quando tudo em nós parece estar perdendo sentido. Um coração perturbado não enxerga nada mais que os seus medos, não enxerga o amor dos outros, a atenção dos outros às nossas penas; não enxerga que o mundo continua percorrendo o seu caminho com a calma de sempre. O coração perturbado cai facilmente na tentação do medo e se fecha em si mesmo, morrendo aos poucos.
Em harmonia com as leituras que a Liturgia nos propôs nesses domingos da Páscoa, hoje o Evangelista nos leva a refletir sobre um dos maiores mistérios da vida cristã diante do qual somente nos cabe ficar admirados e extasiados. Trata-se da nova condição que a Páscoa gerou, e que não se limita penas ao fato da Ressurreição de Jesus, mas envolve a humanidade inteira. Com certeza, o conteúdo deste trecho do Evangelho é complexo e cheio de inúmeras implicações, por isso está longe de nós o desejo de fazer uma análise: iremos apenas refletir sobre o “sentido” daquilo que Jesus quis deixar como herança, a fim de que possamos penetrar mais ainda na beleza da nossa Páscoa.
O Evangelho se abre com admiráveis palavras que aplaca o coração que se agita diante do turbilhão das inseguranças que, muitas vezes, induzem as pessoas a ter gestos e atitudes insanas. «Não se perturbe o vosso coração!» diz Jesus aos discípulos que estão prestes a entrar na maior crise de suas vidas; «Não se perturbe o vosso coração!» nos diz ainda hoje Jesus, quando tudo em nós parece estar perdendo sentido. Um coração perturbado não enxerga nada mais que os seus medos, não enxerga o amor dos outros, a atenção dos outros às nossas penas; não enxerga que o mundo continua percorrendo o seu caminho com a calma de sempre. O coração perturbado cai facilmente na tentação do medo e se fecha em si mesmo, morrendo aos poucos.
Em harmonia com as leituras que a Liturgia nos propôs nesses domingos da Páscoa, hoje o Evangelista nos leva a refletir sobre um dos maiores mistérios da vida cristã diante do qual somente nos cabe ficar admirados e extasiados. Trata-se da nova condição que a Páscoa gerou, e que não se limita penas ao fato da Ressurreição de Jesus, mas envolve a humanidade inteira. Com certeza, o conteúdo deste trecho do Evangelho é complexo e cheio de inúmeras implicações, por isso está longe de nós o desejo de fazer uma análise: iremos apenas refletir sobre o “sentido” daquilo que Jesus quis deixar como herança, a fim de que possamos penetrar mais ainda na beleza da nossa Páscoa.
Essas palavras que Jesus pronunciava, pouco antes do início da sua Paixão, infundem e transmitem uma certeza, uma segurança que está nele e que é própria de cada pessoa que “sabe o que está dizendo”. A agitação do coração e das emoções dificilmente nos permite contemplar os pequenos e grandes milagres da vida e tampouco olhar para dentro de nós mesmos. Aos discípulos “agitados” pela nova situação que estavam começando a enfrentar, Jesus parece recordar as palavras de Isaías: « A vossa salvação está no fato de se converter e sossegar. Pois, na tranquilidade e na confiança está a vossa força » (Is 30,15). Desse modo, o profeta indicava a atitude correta para aprender a viver uma nova e autêntica relação com Deus. A tranqüilidade da qual fala a Escritura não é evasão das dificuldades e dos problemas quotidianos, não é entorpecimento de uma vida relegada a um mundo intimista.
O nosso coração fica “perturbado” quando a dificuldade toma conta de nós mesmos, quando não nos deixa livres e parece ofuscar a capacidade de decidir. O nosso coração está perturbado quando percebemos que uma comum dificuldade se torna maior do que é, nos investe, acaba tomando conta com ímpeto cada vez maior dos nossos sentimentos e, nós o sabemos, um coração perturbado pode provocar grandes estragos!
As palavras de Jesus assumem significado ainda maior se considerarmos o momento e o contexto em que são pronunciadas. Os capítulos 14 a 17 são interpretados pelo evangelista João como o “testamento de Jesus”. De fato, havia um uso entre os judeus (atestado no livro de Gênesis) conforme o qual, prestes a falecer, o pai de família entregava o seu testamento durante uma última refeição, como Jesus fez com os discípulos. O pai de família entregava o seu “patrimônio” espiritual e existencial: tudo o que foi realmente importante em sua vida ele deixava como herança, para que continuasse vivo; entregava a verdadeira riqueza ao filho em que depositava a sua plena confiança, a fim de que esse continuasse, com o mesmo “estilo” do pai, aquilo que o pai não tinha mais condição de realizar. Assim, quando Jesus deixou essas palavras aos discípulos, estava fazendo um ato cheio de significado: era a síntese de uma vida inteira que passava para as mãos dos apóstolos, a fim de que continuassem com o mesmo estilo. A Igreja, a pequena, frágil, contraditória comunidade de Jesus, se tornava herdeira e depositária de toda a confiança do Senhor do universo e da história. Caberia aos apóstolos levar adiante o que foi importante para Jesus e Ele deu-lhes, também, indicações claras de “como” poderiam levar adiante a missão de revelar ao mundo o verdadeiro rosto de Deus e o seu amor pelos homens.
A paz do coração é, sem dúvida alguma, o caminho que mais imediatamente manifesta que confiamos no amor de Deus, que confiamos na sua providência, que não precisamos nos agitar mais tanto, porque, afinal das contas, as coisas não ocupam o centro do nosso interesse, dos nossos desejos: quem ocupa esse lugar é o amor a Deus e o amor de Deus. Enquanto o coração permanece “sem sossego, sem “tranquilidade” (como dizia Isaías), temos um evidente sintoma de que ainda precisamos de “conversão”.
« Deixo a vocês a paz; dou a minha paz a vocês... a paz não como a dá o mundo » (Jo 14,27). Existe uma “paz” que o homem busca com os seus meios, uma paz que é aparente segurança, feita de controle, acordos, acomodação, ambiguidade... essa é a paz alcançada com os meios “do mundo”, ou seja, meios que prescindem da entrega a Deus. Quanto à eficácia desses meios, Paulo é bem claro respondendo aos cristãos de Tessalônica que estavam curiosos de saber quando iria terminar o mundo: «Quando os homens disserem: “Paz e segurança”, eis que lhes sobrevirá repentina destruição, como vêm as dores de parto à que está para dar à luz; e de nenhum modo escaparão» (1Tess 4,3). A paz que não será de modo algum tirada é aquela que provém de Jesus; ora, as coisas de Deus não se obtêm com meios humanos, não se alcançam pelas estratégias que pudermos excogitar, não são frutos da atitude de conquista, mas de entrega. É resultado de uma atitude que aprende a “crer”, como acabamos de ler no Evangelho de hoje.
Mas, o que significa “crer”? Na linguagem bíblica, “crer” não é um ato da inteligência, não significa “admitir”, aceitar, estar convencido. “Crer” indica uma maneira de viver. É um estilo de vida que, independentemente da consciência imediata, uma pessoa assume quando adere, inteiramente, a uma outra pessoa ou a Deus. Assim sendo, entendemos que “crer” significa “deixar-se envolver”. Crer é colocar-se ao lado de alguém, permitindo que a sua presença, o seu mundo, os seus sentimentos, façam parte da nossa vida e vice-versa. “Crer” é a manifestação, na vida, do amor verdadeiro: só se ama de verdade “crendo”. “Crendo” em Jesus, recebemos a “paz” que está no coração de Jesus porque aderimos a Ele. Participamos da “paz” que está em Jesus mesmo nos momentos mais difíceis, porque aprendemos a saborear a sua presença.
«Crede em Deus, e crede em mim» são as palavras de Jesus como nos foram transmitidas pelo evangelista. Algumas traduções, tais como “credes em Deus e crede também em mim” são pobres porque deixam a entender que Jesus primeiro faz uma constatação “já que credes em Deus...”, e depois faz um apelo: “crede também em mim...”. Mas não é esse o sentido. Nem Deus, nem Jesus são os objetos do “crer”, mas a condição, o “lugar” onde se aprende a crer, se aprende a aderir, se aprende o que é a paz do coração. Com as suas palavras, Jesus indica a condição na qual o discípulo poderá aprender o que significa “crer”. “Em”, então, indica que o discípulo aprenderá o caminho do crer “em” (estando) em Jesus. Ouvimos, ainda, Jesus dizer: «onde eu estou, vós estareis também»; será lícito perguntarmo-nos, como fez Tomé: “Afinal, onde Jesus estará depois da sua despedida?”
A resposta não demorou: a comunidade reunida por Jesus é e será o lugar de sua definitiva presença enquanto perdurar o tempo. Ali, o discípulo aprenderá o que significa “crer”, na prática, na vida real, nas opções que precisará fazer, no perdão que receberá e dará. Ali, na comunidade onde Jesus permanecerá vivo, o discípulo poderá respirar algo do amor do Pai e do Filho. Ali poderá intuir o que significou para Jesus “crer EM Deus” ou seja: “estando em Deus”, sempre mergulhado no Pai e, ao mesmo tempo, voltado para os homens.
Permanecendo na comunidade de Jesus, o discípulo poderá fazer a experiência, dentro de suas condições e limites, do amor do Pai e do Filho, a fim de que isso modifique sua vida e seja sinal para os que têm o coração perturbado de que é possível a paz.
Permanecer. Permanecer em Jesus gera a tranquilidade sugerida por Isaías e Jesus. Afinal, quanto uma preocupação poderá perturbar o nosso coração se nos lembrarmos das fortes e delicadas palavras de Jesus: «Eu vos levarei comigo»?
Sim, a decisão de aprender a crer estando em Jesus, no meio de todas as possíveis inseguranças e aflições que nos acometem, provoca aquela paz que tão bem o salmo descreve: «Fiz calar e sossegar o meu coração. Como a criança desmamada se aquieta nos braços de sua mãe, como essa criança é a minha alma» (131,2). Os braços de Jesus irão nos levar a conhecer “quem” é o Pai.
Às vezes, nos momentos que parecem não ter saída, quando tudo fica escuro e o coração perturbado, de repente, gratuitamente, sem mais nem menos, Deus ilumina a sombra, dá calor ao coração... então eu ouço dirigidas a mim as mesmas palavras de Jesus a Felipe: « Você, Carlo, ainda não me conhece? »
Apenas quem se entrega, conhece, tem a paz.
Um bom domingo a todos!
Pe. Carlo
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